Violência contra mulher: O apoio que Boa Vista fornece a essas vítimas
- ranioralmeida
- 29 de jul.
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Locais que ofertam esse auxílio vão além do jurídico, também prestando apoio psicológico e financeiro para estas mulheres.
Por Juliana Soares e Yasmin Tavares

Segundo o Atlas da Violência 2025, a violência contra as mulheres é uma das problemáticas que evidenciam a constante disparidade de gênero que atinge o Brasil. Para a pesquisa, o elevado número de agressões e fatalidades contra indivíduos do sexo feminino expõe a fragilidade das relações de poder na sociedade. A ameaça à integridade da mulher é feita de diversas maneiras, destacando a parcialidade dos casos ocorridos nos lares das próprias vítimas.
Os dados revelados indicam que, apesar do alto número de homicídios contra a mulher, a proporção não é a mesma para todos os estados, com alguns deles apresentando níveis acima da média nacional. Os estados encontrados na região amazônica apresentaram as maiores taxas desses casos, com Roraima, Amazonas e Rondônia, sendo enfatizada a presença de mulheres indígenas nas estatísticas.
Ainda segundo a fonte documental, o estado de Roraima liderou, em 2023, como o maior em taxas de homicídios de mulheres no país, sendo registrados 10,4 casos para grupos de 100 mil habitantes. De acordo com esses e outros dados disponibilizados, 31 mulheres foram assassinadas em 2024.
Diante desse cenário, a assistência fornecida para aquelas que sofrem dessa violência é fundamental tanto para o acolhimento dessas mulheres quanto ao combate a esse índice de hostilidade. Em Boa Vista, essas ações são viabilizadas por meio de projetos e atividades que assistem às vítimas de diferentes violências.
Espaço de autocuidado: um apoio a autoestima
Com o propósito de estabelecer um local que pudesse acolher de forma diferente mulheres vítimas de alguma violência, o Centro Humanitário de Apoio à Mulher (Chame) elaborou uma sala específica para cuidados físicos, onde ficam disponíveis roupas, sapatos, perucas e acessórios.
Pertencente a administração do projeto, Rayza Fialho explica que o Espaço de Autocuidado foi inaugurado em 31 de outubro de 2024 sendo desenvolvido após situações de mulheres vítimas de alguma violência que chegavam fugidas de uma agressão sem nenhum pertence, e muitas vezes dependiam economicamente do agressor. Ela explica como funciona o serviço:
“Quando as mulheres chegam aqui, elas vão para o atendimento com a psicóloga, assistente social e advogada. E na conversa com elas, elas sentem se tem ou não a necessidade de vir até a sala”.

O projeto é mantido por meio de doações de lojas parceiras e da sociedade em geral, além de ser acessível em dias comuns. Nesse ambiente, há atividades como o dia da beleza, onde ocorrem ações de cuidados com a fisionomia da mulher, como a aplicação de maquiagem e sobrancelhas para as mulheres participantes.
A diretora da Secretaria Especial da Mulher da Assembleia Legislativa de Roraima (SEM/ALE-RR), Glauci Gembro, reforça o intuito do espaço para apoiar essas mulheres, dando a elas a possibilidade de enxergar chances de mudanças em suas vidas, de encerrar ciclos e começar novos.
“A mulher, às vezes, sai de casa sem nada. As histórias que a gente escuta aqui no Chame são histórias bem difíceis. Então, quanto mais carinho, melhor a gente atender essa mulher, melhor essa mulher se sente”, afirma.
Além da estatística: mulheres
As informações divulgadas tanto pelos institutos que avaliam os índices da violência contra a mulher quanto pela mídia informacional são recursos utilizados para análise do cenário em que essa adversidade se manifesta na sociedade. Contudo, somente a divulgação de representações numéricas é um meio escasso para contemplar, efetivamente, toda a complexidade que essa problemática se insere no meio social.
Quando se trata de dados em casos de agressões, a abordagem da temática não pode se desvirtuar do enfoque exclusivo na ocorrência. A fim de demonstrarmos a amplitude da circunstância e a gravidade dos índices, há uma necessidade de se comunicar também o que está por trás dos números.
A violência contra a mulher é um conjunto de violação de direitos representados que, muitas vezes, é um desses eventos simplificados a uma sondagem, sem a plena discussão das maneiras em que essa agressão se manifesta. Outro ponto que carece de discussão é o contexto em que ela é impregnada. A violência pode ser diferenciada em dois aspectos: o parentesco entre os membros da comunidade familiar no contexto da violência, no ato de violência familiar, e o ambiente do lar, com relação de familiaridade, não necessariamente havendo parentesco direto, como a violência doméstica.
Conforme a Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, existem cerca de 6 tipos de atentados à figura feminina enquadrados na legislação. O artigo n 7º descreve essas ocorrências:

A coordenadora estadual de Políticas Públicas para Mulheres, que atua na Casa da Mulher Brasileira de Boa Vista, Graça Policarpo, elucida a diferença entre dois termos que rondam o assunto: femicídio e feminicídio. O femicídio é quando o homicídio tem como vítima uma mulher. O segundo, é um tipo de femicídio, no qual uma mulher é vítima de um homicídio pelo fato de ela ser uma mulher e, pela lei, ocorre nas hipóteses de violência doméstica e familiar ou na qual o agressor tenha vínculo, mesmo que mínimo, com ela.

A Casa da Mulher Brasileira é um centro de atendimento humanizado voltado para atender e auxiliar a mulher vítima de violência, com serviços de abrigo para aquelas que, por razões psicossociais ou econômicas, não possuem um local para ficarem. Além disso, o ambiente realiza outros serviços visando fornecer apoio nas diferentes instâncias em que ela é afetada após uma agressão, como a criação e preenchimento de currículo e a oferta de vagas no Sine – RR, a fim de integrar essa mulher no mercado de trabalho.
"Então, quando ela [mulher] chega na casa, ela precisa passar pelo psicossocial, depois do encaminhamento para a casa, ela precisa fazer um boletim de ocorrência, porque depois ela vai para a polícia. E aí, primeiro, ela é ouvida por uma equipe de psicólogos de centro social, uma equipe multidisciplinar, no qual vai passar segurança nesse atendimento, e ela não vai precisar fazer uma via sacra fora da casa para resolver essas questões com a defensoria ou com a promotoria de justiça", explica.
Para Graça Policarpo, há uma necessidade de maior debate sobre a violência contra a mulher na sociedade, pois, para se combater essa adversidade se deve não somente reconhecê-la, mas conhecê-la.
"Se eu não tenho espaço para falar da questão da mulher, dos direitos humanos das mulheres, principalmente os que estão lá na Constituição, você se depara com um Estado que as pessoas não valorizam esse direito. E não é só a violência, na verdade, para mim, de verdade, a violência é uma falha quando o Estado falha. A violência é um resultado disso. Então, o Estado, quando falo, todos os governos, o federal, o municipal, o estadual, e os que nos antecederam, principalmente os que nos antecederam. Estamos tentando construir algo novo, algo melhor, algo que venha realmente impactar a vida dessas mulheres", reflete.
O Amparo da Lei
A advogada Klicya Albuquerque detalha que entre os procedimentos jurídicos que devem ser tomados em caso de violência está a realização de um Boletim de Ocorrência, de preferência na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM). Ela explica que nesta etapa já podem ser solicitadas medidas protetivas, sendo um passo importante neste processo de denúncia. A profissional esclarece a importância de um acolhimento psicológico logo neste início, assim como acompanhamento de um advogado, e reforça que, se não houver condições financeiras para o segundo citado, a vítima deve ser encaminhada à Defensoria Pública, que oferece o serviço gratuitamente.

Em caso de comprovação da violência, a vítima possui direito a uma proteção policial imediata, se houver risco iminente; acolhimento em abrigos sigilosos, quando necessário para sua segurança e de seus dependentes; atendimento médico, psicológico e social, de forma gratuita e continuada; orientação e assistência jurídica integral, tanto na esfera criminal (para processar o agressor) quanto na esfera cível (para questões como guarda, alimentos, divórcio ou partilha de bens). Já em casos de dependência financeira, Klicya cita os projetos apresentados anteriormente:
“Instituições como a Casa da Mulher Brasileira, o Centro Humanitário de Apoio à Mulher e os CRAS/CREAS oferecem suporte para inserção em programas de assistência social, e promovem ações de qualificação profissional para auxiliar a mulher na reconstrução de sua autonomia financeira”.
Para Saber e Informar
A principal forma de combater a violência contra a mulher é por meio do conhecimento em torno do assunto.
Nesses casos, ligar para 180 é um dos principais meios de denunciar uma agressão contra a mulher ou se informar melhor sobre a circunstância. Caso a situação se configure um risco imediato à vítima, a ligação deve ser feita ao 190, o número da Polícia Militar.

Em Roraima, a Central de Atendimento à Mulher — Ligue 180 registrou um aumento de 8,2% na quantidade de atendimentos com relação ao ano anterior, assim como acréscimo no número de denúncias em 26,4%.
Esses dados evidenciam que a maioria dos registros são feitos pelas vítimas, no ambiente em que convive com o suspeito da agressão. Segundo o material, o maior número de queixas se deve à melhoria do sistema, que vem sendo otimizado desde 2023. Essa estatística não se manifesta apenas em Roraima, o país também apresentou um crescimento, cerca de 21,6% comparado a 2023.
Contudo, outro ponto em destaque é a constatação de que as mulheres roraimenses convivem diariamente com a violência em suas vidas, com 89 atendimentos de pessoas que relatam agressões diárias. Ademais, dentre os suspeitos do ato, os parceiros dessas moças são os que mais cometem atos violentos.
Os locais de acolhimento mencionados também possuem canais de atendimento:
O CHAME (Centro Humanitário de Apoio à Mulher) em Boa Vista, Roraima, tem endereço na Avenida Santos Dumont, 1470, bairro Aparecida. O atendimento presencial funciona das 8h às 18h, e o atendimento remoto (Zap Chame) está disponível 24 horas por dia através do número 95 98402-0502.
A Casa da Mulher Brasileira, que fica na Rua Uraricoera, nº 919, no bairro São Vicente, possui atendimento 24h, além de também ser acessada por meio do acesso ao 180.



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